quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Era a porta. Alguém estava a bater.
Começei a sentir-me quente, já suspeitava quem poderia ser, mas tinha esperança que fosse a minha mãe. Mas não era. Era ele, com uma cara muito rigida e séria. Eu baixei o rosto como se estivesse com vergonha de alguma coisa.
Perguntou-me se tinha algum carregador que desse para o seu telemovel. Não tinha, e assim lho disse. Um silêncio apodereou-se da sala. Ficámos ali, como pedras a olhar para a televisão. Sem um simples toque, sem uma simples troca de olhares.
Eu estava a sentir-me sufocada, quente e fria. Até que ele decide quebrar o silêncio dizendo: "qual é o teu problema? Se tens alguma coisa a dizer que seja agora." A pior parte estava a começar. Olhei para ele e disse "não se passa nada." como uma cobarde diria. Virei-me para a frente para que não pudesse ver as minhas lágrimas a escorrer pela cara.
"Sou tão idiota, arranja-me a merda de uns colhões e diz o que tens a dizer, foda-se!"pensei.
Entretanto, ele quebrou-me estes meus pensamentos para me dizer que o meu comportamento levou á situação em que nos encontravamos, que se eu fosse diferente as coisas corriam melhor. Isso pareceu-me suficente para gerar uma discussão. Gritei como nunca tinha gritado, senti todas as minhas veias do corpo a palpitarem. Senti as orelhas a arder e sei lá mais o quê.
Fui a correr para o meu quarto e enquanto fechava a porta gritei que nem uma besta sem educação "puta que te pariu foda-se." e fechei a porta. Isto não é normal, nunca na minha vida me tinha exaltado tanto, senti-me mal. Deitei-me na cama e fechei os olhos. Ele lá apareceu, como faz sempre, para resolver as coisas e pôr uma pedra no assunto. Mas ficou só a olhar para mim com cara de cachorrinho abandonado e eu não queria isso. Queria que me gritasse, que me abana-se, que dissesse que nunca mais queria estar comigo. Mas não. É demasiado bonzinho para fazer isso.
Não aguentei. Corri para a sala, para poder pensar, agir de forma decente. Eu tinha de me acalmar.
Sentei-me no chão em frente ao aquecedor e fiquei a olhar para a televisão. Ele lá aparece, como eu já esperava. Sentou-se ao meu lado.Começei a chorar. Puxou-me para me encontar a ele, mas eu não consegui.Foi como se as mãos dele me estivessem a provocar choques eléctricos.
Olhei para ele várias vezes com as lágrimas nos olhos e ele parece que estava a adivinhar o que a minha boca não conseguia dizer. Foi então que milgrosamente arranjei uns colhões e disse que era melhor nos afastarmos por um tempo. A cara dele... Ficou perdido. Começou a respirar de maneira acelarada, levantou-se e andou de um lado para o outro, como se estivesse muito nervoso.
Pedi que se sentasse, lá o fez, e disse que ele era a pessoa mais espectacular que eu podia conhecer, que era uma sorte ter alguém assim na minha vida, mas era preciso muito mais que isso.Eu estava a abdicar desta perfeição de homem. Não era justo.
Olhámos um para o outro durante uns instantes, foi intenso. Deitei-me no colo dele e ele acariciou-me a cabeça. Assim ficámos. Depois diz uma piada, o que é muito típico dele, e rimos ali, como só aquele momento importa-se e tudo o resto parecia não ter acontecido.
Disse-me "nunca vou amar ninguém assim."
Abraçamo-nos e beijamo-nos, como se nunca mais nos fôssemos voltar a ver. Abri a porta da rua, o meu coração apertou, e ele lá foi pela rua escura de mãos nos bolsos.